Os efeitos jurídicos decorrentes da interpretação da norma.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Litisconsórcio facultativo impróprio e a sua relação com o litisconsórcio multitudinário.

Litisconsórcio é a reunião de vários autores e/ou vários réus em uma mesma relação jurídica processual. Sempre que houver uma pluralidade de pessoas em um dos polos do processo diz-se que eles são litisconsortes. Pode existir litisconsórcio quando vários autores ingressam com a mesma demanda (litisconsórcio ativo), bem como quando vários réus são indicados pelo autor na petição inicial (litisconsórcio passivo).

O litisconsórcio é necessário quando a presença de todos os litigantes é essencial para a solução da demanda, isto é, sem a presença de todos os autores ou de todos os réus (todos citados) o processo não pode ter uma sentença de mérito válida. A ausência de algum dos litisconsortes necessários implica a extinção do processo sem resolução do mérito.

O oposto do litisconsórcio necessário é o litisconsórcio facultativo. Diz-se que há litisconsórcio facultativo quando, apesar de não haver obrigatoriedade de pluralidade de partes, tal pluralidade deriva de escolha ou vontade de quem propõe a demanda. A ação pode ser proposta por vários autores ou contra vários réus dentro de um mesmo processo ou em processos distintos.

No litisconsórcio facultativo há o exercício de diversos direitos de ação, que poderiam ser oferecidos em processos diferentes para cada litisconsorte. Como exemplo, “A” propõe uma única demanda contra “C”, “D” e “E” (litisconsortes passivos facultativos); todavia “A” poderia escolher propor uma demanda contra “C”, outra demanda contra “D” e outra demanda contra “E”.

Não há, no litisconsórcio facultativo, a obrigatoriedade (a necessariedade) de formação do litisconsórcio.

Quanto ao regramento do litisconsórcio, estabelece o Artigo 46 do Código de Processo Civil:

“Art. 46. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:

I - entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide;

II - os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito;

III - entre as causas houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir;

IV - ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito.

Parágrafo único. O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa. O pedido de limitação interrompe o prazo para resposta, que recomeça da intimação da decisão”.



O inciso I acima trata do litisconsórcio por COMUNHÃO, onde os interesses são comuns (ex.: litisconsórcio dos condôminos, dos credores solidários); os incisos II e III nos revelam o litisconsórcio por CONEXÃO, em que os interesses são distintos, mas estão ligados entre si (ex.: mãe e filho em litisconsórcio contra o pai: o filho quer reconhecimento de paternidade e a mãe ressarcimento das despesas do parto); por fim, o inciso IV nos revela o litisconsórcio por AFINIDADE, onde as pessoas são reunidas em razão de se encontrarem em situações parecidas (ex.: contribuintes de um mesmo tributo; vários consumidores vão a juízo para não pagar taxa de telefonia).

Esse litisconsórcio por afinidade está intimamente relacionado com as chamadas causas repetitivas, isto é, causas de massas em que dezenas, centenas ou até milhares de pessoas encontram-se em uma mesma situação, procurando elas o poder judiciário com o mesmo fundamento de fato e de direito.

No CPC de 1939 o réu poderia recusar o litisconsórcio por afinidade ativo. Isso queria dizer que o réu tinha o direito de não ver-se processado por vários autores em uma mesma relação jurídica processual, quando a hipótese fosse de afinidade. Por isso que se dizia, à época, que o litisconsórcio por afinidade ativo era um litisconsórcio recusável, também chamado de litisconsórcio facultativo impróprio – era direito potestativo do réu recusar o litisconsórcio.

O CPC 1973, em sua redação original, eliminou a possibilidade de recusa do litisconsórcio pelo réu. Todavia, nas décadas de 70 e 80, com o crescente fluxo do sistema econômico, muita gente passou a ingressar no mercado de consumo, gerando, de consequência, problemas de “massa”, de “multidão”. Vários consumidores eram titulares de relações jurídicas em comum (afinidade) e ingressavam conjuntamente em juízo com o objetivo de solucionar os problemas enfrentados.

É aí que surge o chamado LITISCONSÓRCIO MULTITUDINÁRIO, que nada mais é do que um litisconsórcio facultativo com multidão de partes.

Com esse fenômeno, veio o legislador e resgatou a possibilidade de o réu não aceitar esse litisconsórcio, inserindo em 1994 o Parágrafo Único no Artigo 46 acima transcrito, onde o juiz pode limitar o número de litisconsortes facultativos quando a quantidade de autores comprometer a rápida solução dos litígios ou dificultar a defesa.

O juiz pode limitar de ofício, mas o réu também pode formular esse pedido de limitação do litisconsórcio multitudinário facultativo antes de efetuar a defesa. Isso significa que, hoje, litisconsórcio facultativo impróprio é essa possibilidade de o réu recusar a formação desse litisconsórcio multitudinário. Apesar de haver litisconsórcio ativo, este é facultativo e o réu pode recusar ele quando multitudinário: daí ser denominado impróprio.



REFERÊNCIAS:

CÂMARA, Alexandre. Lições de Direito Processual Civil. Vol. I. 18ª edição, 2008, Lumen Juris.
DIDIER JR. Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. Editora Juspodivm, 11ª edição, 2009.
THEODORO JR. Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. Editora Forense, 51ª edição, 2010.

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